quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Terra, de Sebastião Salgado

Está esgotado e nos sebos, quando encontrado, pede-se já bem pra lá dos 100 reais. Deveria ser gratuito. Universal. Adotado nas escolas. De um só golpe, trabalharia a educação visual pra dar alguma qualidade ao olhar dessa geração extensivamente fotográfica, e a história e sociologia do Brasil. Está tudo lá: etnocídio, latifúndio, êxodo rural, estado, oligarquia, sem terras, opressão e, por que não?, esperança. Tudo o que importa saber. Sai Carlos Magno, com todo respeito, entra Eldorado dos Carajás, com toda violência. Sai oração coordenada assindética, entra José Saramago.

Serra Pelada, Pará, 1986

Ainda não consegui aceitar que as gerações mais recentes que a minha, que é apática, sejam conservadoras. Se com 16, 17 anos, a vida inteira por fazer, uma pessoa não anseia por justiça, o que ela vai querer aos 40, com emprego, casa, carro e filhos? Por que o argumento dilma-não-pois-queremos-igualdade perde tão feio, entre os jovens, para o dilma-não-pois-é-bandida-terrorista? Quando isso acontece, estou muito perto de dizer que todos os anos de ensino de história falharam. Pois tanto bláblábá deveria servir, no mínimo, pra que as pessoas saibam que cada acontecimento histórico só faz sentido dentro de seu contexto.

Sergipe, 1996

Sorvendo Terra com todo o cuidado, lendo cada legenda, observando com atenção cada foto, sinto um misto de nó na garganta, vergonha e blues. Por ser brasileiro, por fazer muito pouco para acabar com o que está ali posto, por ver que, se depender dos mais novos, far-se-á cada vez menos. A sensação que fica é que é um livro que não se repetirá, mas não pela extinção de seu objeto, a luta pela terra, nem pela extinção dos bons fotógrafos, mas pela extinção da sensibilidade que une técnica e tragédia numa obra de arte prenhe de poder transformador.

Sergipe, 1996

Pra pisar fundo nesse sentimento de degenerescência temporal - que, espero, esteja errado - vai um video da época do lançamento do livro. O bufão Jô Soares entrevistando numa só noite, de uma só vez, um ao lado do outro, o Sebastião Salgado, o José Saramago e o Chico Buarque de Holanda. Convido quem não entendeu a piada a conferir os programas atuais do entrevistador.